Um filme de Patrice Leconte.
Escandalosamente carregado de humor negro, essa animação franco-belga-canadense é voltada para adultos (inclusive há palavrões em toda a trama). A crise econômica europeia dos últimos anos (que colocou Grécia e Portugal num aperto) tem afetado o ânimo da população, a exemplo da crise norte americana de 29, que foi logo chamada de Grande Depressão.
Leconte, em sua estreia, nos leva para dentro dessa depressão contemporânea, adaptando a obra homônima de Jean Teulé (publicada em 2006) . Aqui a França se torna um lugar triste, fúnebre, cinzento; no qual as pessoas lamentam a vida que têm que a que terão, e a única saída que possuem é se suicidarem. Há índices altíssimos de suicídio, que em locais públicos é proibido e passível de multa. Quem se aproveita disso é a família Tuvache, que tem uma loja (legalizada!) onde tudo que é capaz de matar é vendido para as pessoas se matarem com "requinte". Mas o caçula da família é feliz e vê a vida de forma leve, e vai tentar fazer algo para mudar as coisas.
Muito tem se discutido a respeito da questão moral do suicídio, visto por alguns filósofos como um modo de o indivíduo exprimir a sua liberdade,
aqui se torna objeto de consumo, e contribui com o lucro visado pelo capitalismo que colocou o continente (e o resto do mundo) em crise. Mas o filme não discute sobre ideologias políticas, nem tenta se aprofundar nesse assunto filosófico e religioso. Ele satiriza tudo isso, mostra à França o que o país se tornou. A obra é, em parte, um musical. Há algumas canções sombrias, ácidas, que ajudam a contar a trama e principalmente nos faz compreender melhor o contexto no qual vivem os personagens. Com uma dublagem viva, eles oscilam entre a melancolia, a raiva, o remorso. Mas todos tem em comum a infelicidade. Até o pequeno e alegre Alann, pois apesar de seu otimismo ele sofre por estar imerso num ambiente tão obscuro.
As piadas são boas (reparem nos slogans e propagandas da loja) e, a maioria, inteligentes; e o visual do filme um espetáculo à parte. Feito em duas dimensões, com os contornos em negro, ele tem uma aparência que lembra um pouco grafites, ou até mesmo algumas animações web ou da TV, o que para mim foi uma experiência nova, mas muito interessante. A imagem brinca com a iluminação e com as sombras, ostenta detalhes e oscila entre o cinzento e cores vivas belíssimas. Mas se a premissa é interessante e ousada, a trama tropeça um pouco. É impossível não sentir um desconforto quando o filme chega perdo de seu final um tanto previsível: mudanças na personalidade dos personagens ocorrem rápidas demais, de forma forçada. Mas estes deslizes não tiram o mérito da película de Leconte, que entre risos irônicos e contidos e risadas fartas nos apresenta um pouco do que tem se tornado o mundo.
#ficaadica
Nenhum comentário:
Postar um comentário