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segunda-feira, 2 de março de 2015

Era uma vez em Tóquio (Tôkyô monogatari) - 1953; o derradeiro encontro

Era uma vez em Tóquio (Tôkyô monogatari), lançado em 1953.
Um filme de Yasujiro Ozu.
Conhecidíssimo na comunidade cinéfila, Era uma vez em Tóquio, do não menos influente Yasujiro Ozu, é tido como um dos melhores e mais importantes filmes da história. Sempre presente em rankings feitos por publicações, sites ou organizações, esta obra japonesa do período pós-guerra, de caráter minimalista, narra a viagem de um casal de idosos do interior do país até Tóquio, onde visitam os filhos. Temas como envelhecimento, solidão, distanciamento geográfico, morte, gratidão e amor familiar permeiam a narrativa lenta filmada com câmera estática.

O casal de aposentados Shūkichi e Tomi Hirayama moram no interior do Japão, em Onomichi, distante da capital Tóquio, para onde viajam para ver os dois filhos mais velhos (a mais nova fica em casa e o mais novo mora no meio do caminho, em Osaka) e a nora viúva. Chegando lá encontram a família diferente do que se lembravam, com os filhos fazendo pouco caso da visita deles, arrumando meios de despachá-los e os netos mal-criados. Por outro lado a nora trata-os muito bem.

Ozu é muito conhecido em todo o mundo. Todos o consideram um dos cineastas mais influentes do Japão e do mundo. E é conhecido também pelo estilo lento de seus filmes. Uma espécie de cinema contemplação primitivo, menos pretensioso. Era uma vez em Tóquio, seu mais conhecido filme, segue o estilo. Ele filma o cotidiano da família Hirayama, sem pressa. A câmera completamente estática (outra marca sua; não me lembro de ver nenhuma panorâmica ou traveling neste filme), colocada baixa, à altura do pescoço de pessoas sentadas no chão (aliás, no tatame, um costume japonês) observa paciente a banalidade da vida familiar. Às vezes fita rostos em específico, em close, outrora observa de uma distância abrangente e séria; outras vezes filma o vazio (ou quase isso), o espaço, o tempo.

Aliás o tempo é talvez o verdadeiro protagonista desta obra. A passagem do tempo tem influência gigantesca na vida humana. É na fluidez do tempo que amadurecemos, aprofundamos relações ou nos distanciamos das pessoas, memórias são filtradas, amores antigos são esquecidos e caminhamos em direção à morte. Ozu mostra com delicadeza como envelhecer é um processo inevitável, solitário e fisicamente doloroso.
"A vida é frustrante", diz uma personagem em determinado momento, ainda abalada com a morte de um familiar.
A definição de família também pode ser um conceito vago. Mas que é sempre debatido. Na atualidade brasileira se discute se um casal homossexual pode ser considerado uma família e se pode adotar crianças; naturalmente os mais conservadores dizem que não. Há quem diga que pais que criam os filhos sozinhos não são uma família no sentido completo da palavra. Há quem defenda que família é laços de sangue; outros que é um núcleo de pessoas que se amam. Os menos amargurados dizem que amigos são uma espécie de família. O certo é que neste filme de Ozu as maiores demonstrações de carinho vêm de onde menos se espera. Enquanto os filhos estão ocupados trabalhando (em certo momento um deles mente aos clientes que os pais são amigos do interior), a nora pede uma folga apenas para levá-los para passear pela cidade e os chama de pai. Mesmo que o marido tenha morrido há tantos anos que ela própria já começa a esquecê-lo.

Tôkyô monogatari foi filmado num contexto bem específico da história japonesa. Menos de dez anos depois do final da Segunda Guerra, de onde o país saiu destruído. Ainda contavam-se os mortos quando Ozu lançou um olhar sobre o processo de ocidentalização (e capitalização) no país. A tradição começava a ser deixada de lado, sobretudo pela juventude em busca de dinheiro e sobrevivência, e os japoneses ficavam cada vez mais parecidos com os povos ocidentais. Pelo que se vê no seu filme, o cineasta via isso num misto de resignação e contrariedade.
Mas mesmo tendo esse contexto, a película permanece atemporal e a temática universal. O modo que vivemos, que convivemos em família, que tratamos nossos idosos e todas as outras pessoas ao nosso redor talvez não seja o ideal.

Mas ao menos uma coisa é inquestionável: sentimental sem ser piegas, este filme emociona e encanta pessoas nas últimas seis décadas.

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