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domingo, 24 de maio de 2015

O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (The Hobbit:The Battle of the Five Armies) - 2014; o fim da aventura de Bilbo

O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (The Hobbit:The Battle of the Five Armies), lançado em 2014.
Um filme de Peter Jackson.

Finalmente o encerramento da segunda trilogia de Peter Jackson em cima da obra literária de Tolkien. Este filme é a sequência de O Hobbit: A desolação de Smaug O Hobbit: Uma jornada inesperada. Jackson é o mesmo diretor da trilogia O Senhor dos Anéis.

Depois de chegarem à Montanha Solitária, Bilbo e os anões irritam Smaug, que furioso deixa a montanha e parte em direção à cidade humana próxima para destruí-la. Eventualmente o dragão é derrotado, mas a paz não é prontamente assegurada já que homens, anões, elfos, orcs, wargs e morcegos e águias se enfrentam pelo inestimável tesouro que existe dentro da montanha.

Tudo de bom e tudo de ruim que há nos dois primeiros filmes está aqui. Como esta trilogia é um grande caça-níquel criado e mantido às sombras do sucesso da infinitamente melhor Trilogia do Anel, optou-se por dividir um único livro (menor que cada um dos três livros da outra trilogia) em três longos filmes. Mais acertado seria no máximo dois filmes, mas algumas centenas de milhões de dólares por um filme a mais sempre são bem vindos. Assim, os três títulos são arrastados, cansativos e perde-se tempo com distrações, bobagens ou cenas longas em excesso que não combinam com um filme de ação. Outras vezes a trama começa a fluir e então o fluxo é interrompido por pouca coisa. Apesar disso, este é o mais enxuto dos três e também o mais curto em duração, mesmo com aberrações de roteiro como o caso Alfrid. Por outro lado a morte de Smaug é tão rápida e "fácil"... o dragão merecia morrer de modo mais interessante.


Defeito para uns e interessante para outros, aqui também se usa em excesso as computações gráficas. Até um dos atores da Trilogia do Anel, Viggo Mortensen, que lá interpretara Aragorn já chegou a comentar em entrevista que Jackson é obcecado por computação gráfica e a usa em detrimento de outras qualidades artísticas. E que isso já era evidente em O Senhor dos Anéis, mas a própria limitação técnica da época freava um pouco essa compulsão. Computação gráfica é um recurso que deve sim ser explorado e sem ela jamais teríamos uma representação tão maravilhosa da Terra Média. Mas ao mesmo tempo esse é um recurso que tem enorme poder para deixar tudo muito pouco realista. Certos monstros e cenários possuem aparência de jogo eletrônico. E para mostrar esses cenários e personagens ao máximo, às vezes se deixa trama e profundidade dos personagens e segundo plano, como que a dizer "eis aqui o que sou visualmente capaz de criar". Uma coisa que me incomodou muito também é a quase completa ausência de sangue em meio à guerra. Claro que é meio de evitar censura da classificação indicativa, o que reduziria lucros, mas essa falta dos orgânicos fluidos, (além de sangue, de suor, mata-se um exército sozinho sem uma única gota brotar das testas maquiadas dos atores) não só deixa tudo menos realista como faz o desfavor de mostrar a violência como algo sem consequências negativas. E não venham dizer que elfos e anões não tem sangue nem suor porque têm, assim como os humanos que também são mortos sem sangue e lutam sem suor.

A trilha sonora quase passa despercebida, tirando a ótima canção-tema que aparece com os créditos finais. Chamada de The Last Goodbye, a música foi escrita e interpretada por Billy Boyd, que também é ator e fez o hobbit Peregrin Tûk na Trilogia do Anel. A letra, lindíssima, remete subliminarmente não só às aventuras de Bilbo como também as de Frodo, protagonista do Senhor dos Anéis. Tanto que o clipe oficial mostra cenas dos seis filmes. Soa como uma despedida definitiva, parece que Jackson não há de voltar a filmar Tolkien e ao mesmo tempo é uma celebração da amizade. Mesmo sem o sucesso estrondoso semelhante ao de  My Heart Will go on, canção-tema de Titanic, acredito que esta música resistirá ao tempo como um símbolo e uma emotiva síntese do enredo das duas trilogias.

Em suma este é um filme divertido, assim como o restante da trilogia, mas nada comparável ao que Jackson filmou no início dos anos 2000. Mas visitar a Terra Média, principalmente para gente como eu que curte Tolkien, sempre é gratificante.
Se houver qualquer problema com o vídeo, por favor nos avise nos comentários.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

A Criança (L'enfant) - 2005; e a maturidade tardia

A Criança (L'enfant), lançado em 2005.
Um filme dos Irmãos Dardenne (Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne).
Trabalho excepcional destes reconhecidos irmãos belgas, L'enfant, filme que ganhou a Palma de Ouro, fala sobre modernidades e a desumanização dos indivíduos num contexto capitalista e globalizado. A obra, cuja sinopse é ter um jovem casal acabado de ganhar um filho e a criança ser literalmente vendida pelo pai, é realista e promove reflexão.

Em tempos de um movimento conservador que clama por redução da maioridade penal e de elevados índices de gravidez precoce recebidas com disparates do tipo "criança que faz filho não é mais criança", filmes como este, mesmo já a completar 10 anos, são pertinentes.
Sônia, a mãe, tem 18 anos, Bruno, pai e protagonista, 20. São duas crianças, suas ações denunciam: brincam, têm quase nenhum senso de responsabilidade, vivem o agora sem um mínimo de planejamento futuro. Bruno arruma dinheiro com pequenos furtos cometidos com dois adolescentes, Sônia é desempregada. Ele recebe a notícia de que é pai quase que com indiferença, ela tem vagas noções de maternidade. A criança que acabam de gerar tem significados diferentes para ambos. Perambulam com o filho no colo por abrigos e pela rua. São desenraizados, rebeldes, marginalizados. Estamos entre os pobres da Bélgica, na parte mais esquecida de um país onde, talvez, sequer imaginávamos existir tráfico humano.

Costuma-se chamar o cinema dos Dardennes de realista, e ele de fato é. Aqui esse realismo choca e inquieta. A narrativa e a fotografia são cruas, mostram o que é para ser mostrado, sem intervir ou julgar. É tudo muito simples, mas não muito trivial: a trama traz à tona um debate sobre maturidade e a que ponto chegamos onde o ser humano é uma mercadoria quase nos mesmos moldes dos tempos de escravidão. É uma obra humanista que busca fazer sua contribuição à arte na árdua tarefa de nos ajudar a entender o mundo e a humanidade. Em quais tortuosos caminhos estamos a avançar? Há ações imperdoáveis? É um estudo sobre perdão, redenção e as relações humanas que culmina numa derradeira cena que é purificante mas também dolorosa. Também é uma obra minimalista, que usa o mínimo necessário de diálogos, sons e dramas.

Conhecidos pelo uso intenso de planos sequência, os irmãos repetem aqui a fórmula que deixa a obra ainda mais verossímil e nua. Ao contrário de outros filmes, porém, onde a câmera persegue os personagens a curta distância (como em O filho, obra das mais conhecidas deles e que filma, com câmera de mão trêmula a nuca de seu protagonista), aqui a fotografia é mais ampla e a câmera se mantém mais distante e passiva. Também não é um filme demasiado lento e estático, pelo contrário é fluido e nos mantém atentos.

Dardennes não são para qualquer um, são filmes duros, difíceis. Mas para quem gosta de um cinema-verdade, estão entre as melhores pedidas. E A Criança os revela em sua melhor forma.

sábado, 9 de maio de 2015

A Pele que Habito (La piel que habito) - 2011; sexo e vingança

A Pele que Habito (La piel que habito), lançado em 2011.
Um filme de Pedro Almodóvar.
Do que conheço da obra de Almodóvar, infelizmente este filme é o pior do diretor, embora ainda seja razoável. Acontece que o seu já conhecido estilo de filmar histórias absurdas, aqui parece ter passado um pouco da conta, o que causa certo incômodo. Também faz falta a conhecida fotografia em tons cálidos e cores vivas.
Roberto Ledgard (Antonio Banderas) é um famoso cirurgião plástico que realiza experimentos para criar uma pele artificial capaz de ajudar pessoas queimadas. Em certo momento sua filha, que tem problemas mentais ligados a traumas envolvendo a falecida mão, é quase estuprada, o que gera uma crise na garota. O médico, então, elabora uma vingança contra o agressor.


Assim como a maior parte da obra almodovaresca, aqui temos um filme onde questões de sexualidade e gênero são abordados. Porém este assunto aqui é explorado de modo mais incomum, escorado no suspense, gênero que o diretor mostra certa dificuldade em trabalhar. Os frequentes personagens travestis, homens em sexo que se reconhecem como mulher ou desejam ser como uma, aqui dão lugar a um homem hétero preso contra sua própria vontade na pele de uma mulher. Em comum esses personagens têm o fato de estarem desconfortáveis com sua situação de não se reconhecerem em seus próprios corpos. Desconstrução absoluta.
Acontece que esta trama, e também todas as várias subtramas, carregam um absurdo exagerado, que choca mas logo nos deixam completamente incrédulos.


Além destas questões de gênero, vingança e bioética aparecem no texto vindas de um cientista louco. Aliás, não parece haver um personagem "normal" aqui. Todo mundo com hábitos estranhos, falas proferidas com a frieza de psicopatas. Toda a gente excêntrica. Tudo bizarro. Cenas que seriam tensas, brutais, chocantes, geram risos, ora desconfortáveis (ali há sim humor negro) ora de escárnio. No final nem há a empatia do drama, nem a surpresa do suspense, nem o horror da violência. Só um mal estar deixado pelas risadas.

O filme peca também na montagem. Para começar a trama melhor funcionaria se fosse linear, mas ela volta e avança no tempo. Isso é desnecessário e só serve para deixar o filme confuso. A conhecida fotografia de Almodóvar, colorida, alegre, de tons quentes, aqui, com raras excessões, é asseptica, fria. A nudez sempre explorada com enorme sensualidade, aqui, sob uma luz fluorescente de um consultório, pouco tem de sensual. Aliás é também o menos sensual dos filmes que já vi do cineasta. Se limita a Elena Anaya metida num colant bege a fazer ioga e uma decoração de pinturas de nus femininos. A trilha sonora, porém, é legal.

Depois de tantas ótimas obras não é qualquer deslize que vai queimar o filme de Almodóvar, mas ele tem sim momentos bem melhores.

sábado, 2 de maio de 2015

Aurora (Sunrise: A Song of Two Humans) - 1927; marco no cinema

Aurora (Sunrise: A Song of Two Humans), lançado em 1927.
Um filme de F. W. Murnau.
Citado por gente como Scorsese, John Ford e Truffaut como um dos filmes mais belos já realizados, Aurora, mesmo feito em tempos de grandes estúdios e cinema exclusivamente comercial, é bastante autoral. Uma das primeiras grandes produções dos estúdios Fox, o diretor, o alemão F.W. Murnau, teve uma liberdade relativamente grande na hora de conceber a obra, que fez uso de técnicas inovadoras para a época e é um dos mais lembrados do cinema mudo. A protagonista, Janet Gaynor, foi a primeira atriz a ganhar um Oscar, na primeira cerimônia do prêmio.

Uma mulher da cidade passa uma temporada de férias no campo. Lá conhece e se torna amante de um fazendeiro casado e pai de um bebê. A amante tenta convencê-lo a matar a esposa afogada para juntos fugirem para a cidade. O homem quase faz isso, mas depois, arrependido, tenta reconquistar a esposa.

Famoso na Alemanha devido a seu cinema expressionista (este movimento de vanguarda, iniciado na pintura, acabou se espalhando por todas as vertentes artísticas), Murnau foi convidado pelo dono da Fox a se mudar para os EUA e filmar em Hollywood. Disso surgiu Aurora, bastante influenciado pelo movimento.
O cinema expressionista, assim como a pintura, almeja expressar sentimentos ou visões de mundo do autor, mesmo que isso represente uma "ruptura com a realidade". A pessoalidade da obra é mais importante que uma simples representação objetiva de algo. É um estilo bem subjetivo, e que na maior parte das vezes representa uma visão de desespero ou desolação em relação ao mundo. Aqui, estes elementos surgem em forma de altos contrates na fotografia, jogos de sombra e luz, dualidades entre bem e mal, expressões exageradas de atores, maquiagem carregada e uma trama sobre tragédias, más intenções e até pessimismo em relação às mudança que ocorriam no mundo.

Numa mistura de drama, comédia, romance e suspense, o filme é um legítimo e dos mais antigos representantes do melodrama; outra consequência das influências expressionistas que queriam atingir o emocional do público. O protagonista, homem errante, ambíguo em tempos de personagens maniqueistas, depois da falta cometida por sucumbir às tentações, precisa reconquistar a mulher, adquirir seu perdão. Este triângulo amoroso é parte essencial de todo o simbolismo da obra. A amante, mulher da cidade, segura de si, ambiciosa, que se veste de colant preto e tem os cabelos curtos da moda, cheia de malícia e, por que não dizer, maldade, é a oposição da esposa, mulher campestre, submissa, ingênua, pura, de olhos infantis, metida em simples e largos vestidos brancos, de cabelos loiros longos e rosto angelical que em certo momento parodia imagens da Virgem Maria. Uma sempre aparece em cenas escuras, sombra em meio às sombras, a outra é iluminada pela luz do dia. A cidade, para onde a população do mundo, até então rural, se dirigia naqueles tempos é o mar do mal, berço do capitalismo predador e da destruição da família. Na primeira parte do filme, o pecado e a escuridão; depois a redenção que o deixa mais leve e bem iluminado.

De um ponto de vista mais técnico, este filme foi o primeiro longa a usar de uma trilha sonora gravada (antes a música, quando existia, era executada por músicos ao vivo durante a exibição) e efeitos sonoros (sons de trens, trovoadas, trânsito, sinos, complementam o filme). A novidade só não foi maior porque poucos dias antes estreava o primeiro longa falado da história, O cantor de Jazz (post em breve) e o cinema mudo começaria a definhar em breve. Além disso, o filme tem um uso interessante de sobreposições e recortes, os efeitos especias da época. São usados para ilustrar os sentimentos, sonhos e ilusões de personagens, como quando o homem se imagina sendo abraçado pela amante ou o casal caminha pela cidade com a impressão de estarem num paraíso rural.
Mas o filme ficou conhecido mesmo foi pelo seu inovador uso de movimentos de câmera, uma ruptura com o passado de câmeras estáticas. Claro que há os momentos de tripé, maioria, mas também aparecem travelings, perseguição a pegadas e nucas, closes, e até discretos planos-sequência a explorarem cenários. Uma cena lindíssima é a feita dentro do bonde, que avança filmando seu caminho.

Além de lindo e sensível, Aurora é imprescindível para entender melhor a história do cinema.